16 outubro 2013

A pont’apé e as minhas três opiniões.



Nota prévia: Quando manifesto a minha discordância perante o simbolismo das bandeirinhas pretas de luto como protesto político, encontro sempre numa certa esquerda alguma resistência, porque estou a retirar-lhes um símbolo. É que entendo que basear uma ação no significado do que possa parecer a forma como se faz, é teatralizar um ato.
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A TRAVESSIA DA PONTE – I opinião.

A primeira impressão que nos causa uma notícia é sempre a mais genuína de todas. Foi assim que a primeira vez que ouvi o anúncio da manif/travessia da ponte, me ocorreram duas questões que relacionei: uma, foi aquela dos 226 sequestrados do Bairro da Bela Flor que isolados de uma manif destas, acabaram encurralados pela polícia nos acessos à Ponte, relação que nunca deixaria de ser feita entre o que aconteceu a esta ação e à proposta de agora pacificamente conquistar a ponte, e a outra, de que seria uma manif feita no âmbito do simbólico, primeiro porque as pontes são sempre um elemento propenssíssimo a todos os simbolismos, como aquele das alamedas de gente, - e eles fazem lembrar-me aquelas jarras pirosas que não deitamos fora e não sabemos porquê -, e depois, porque uma multidão a ligar as duas margens através de uma ponte monumental é coisa próxima de terrenos que me fazem impressão que se pisem, e não é por questões de segurança, para não falarmos já na inconsequência do resultado para tanto investimento de esperança, ou seja: com manifs destas podem eles bem. Se a isto juntarmos aquela conversa do Arménio Carlos ao Mário Crespo, na SICN, fica composto o ramalhete. Diziam eles:

Arménio:-“Nós não estamos aqui para oferecer em bandeja de ouro uma situação de conflitualidade ao Governo!”
..Crespo:-“Diga-me lá, vocês que até são aceites pelo Governo pela não conflitualidade, isto não representa uma escalada de violência?”
Arménio:-“Não! É precisamente o contrário!”
..Crespo:-“(bla bla, bla bla.)”
Arménio:-“Nós não vamos bloquear pontes!”
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Pronto, fico mais sossegado! 

Post Scriptum: Porque este post só vai ser editado depois da manif, para não desmobilizar porque lhe é critico, o texto em cima foi escrito durante a manhã de sexta feira do dia 11, e na tarde do mesmo dia, li a seguinte declaração de Joaquim Dionísio: “Ouvido no Fórum da TSF, Joaquim Dionísio sublinhou o simbolismo da marcha de dia 19 na ponte 25 de Abril e garantiu que a CGTP está satisfeita com o incómodo do Governo”. Logo de seguida, foi Carvalho da Silva a bater na mesma tecla: o simbolismo. Aí está. Estas declarações só confirmam o que escrevi em relação à presença deles nesta manif/travessia, ou seja, que há qualquer coisa que me faz recuar perante a construção de um país assente em tanto simbolismo. Preferia realismo, porque a revolta nunca é transferível para panos pretos e coisas afins. Os simbolismos? Ultrapassam-me, não me convidem para os transportar. Mais uma razão para não ter filtrado nada em relação às minhas perceções iniciais.
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A TRAVESSIA DA PONTE – II opinião

Mas estranhamente faltam 4 dias para a manifestação - já é dia 15 -, e é o próprio governo que me está a fazer mudar de atitude, ou seja, sem embargo de tudo quando escrevi, porque mantenho a mesma opinião, é preciso dizer que são estas atitudes de tentar boicotar o protesto através de precauções de segurança, quando se trata de pessoas em marcha na ponte mas não se colocaram com pessoas aos saltos numa competição, que incentivam a que o protesto se faça. Torna-se evidente que é uma forma de a inviabilizar, e nesse sentido, a manifestação ganha um novo élan que não tinha à partida: é agora um desafio irrecusável e muda-lhe substancialmente o cariz.

Faltam 4 dias e por aquilo que acabei de escrever entendo que o texto já não é desmobilizador, daí que com segurança, acho que o devo editar antes da dada em que esteve para sair.

A TRAVESSIA DA PONTE – III opinião

Mas não tão estranho quanto isso ia publicar o texto hoje de manhã, faltam 3 dias – hoje é dia 16 – e a CGTP cancelou a marcha! Não há por isso pé na ponte, ou seja, é uma ponte fora de pé. Resultado, não foi ninguém ao banho. Também é simbólico, não?
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Dizia Miguel Torga que ao país, “Falta-lhe o romantismo cívico da agressão”.



A TRAVESSIA DA PONTE – IV Conclusão
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Dia 19, 18:30 - Fiquei cansado, desmobilizado, igual a um dia cheio de nuvens, mas sobretudo preocupado, porque não é desta forma que lá vamos. As canções do Alentejo alimentam os ouvidos mas não a esperança. Esta receita equivale a destapar a panela: só lhe retira a pressão. Por muito boa vontade que tenha esta gente boa que hoje veio de tão longe para molhar os ossos, não chega. É altura de pensar que conquistas se devem ao simbolismo. Não sei se eles querem, sei que não os deixam ter outra atitude, e o futuro que queremos, assim, nunca mais é.
 

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