19 novembro 2006

Novamente a Madeira.


O problema está hoje um pouco atenuado porque a última crise do turismo lançou o alerta, mas quem não se lembra de ir ao Algarve e sentir pela forma do trato que não era o turista preferido por ser nacional?

Estive na Madeira em 1976 e também lá me fizeram sentir, atónito que era um "continental". Hoje, desconheço com que mimos seria recebido, embora não me falte curiosidade.

Sempre que ía nas férias grandes ao Alentejo não deixava de ser um lisboeta e lá estava aquele anátema sobre o forasteiro peneiroso, vindo daquela metrópole que muitos nem conheciam. Presumo que existirão por essas aldeias europeias a mesmas segregações em relação às suas metrópoles. É por esta espécie de preconceito, por um lado e o desenvolvimento económico alavancador da economia por outro que se verifica em todos os países o mesmo fenómeno da disputa de cidade principal, capital do estado, por outra segunda cidade. Consoante o ponto de vista, uns dirão que é a força centrípeta que exercem sobre o resto da nação e outros que é mais uma força centrífuga. A querela já vem de longe e vai continuar. Pinto da Costa dá-nos todas semanas um murro no estômago a este propósito e juro-vos que nos apanha sempre distraídos, primeiro, atónitos depois e confusos ainda hoje.

Vem isto a propósito, do problema que começa a ser a Madeira, não só porque Jaime Ramos vai fazer-nos saudades do Alberto João, como pela exploração dos tais ressentimentos inerentes à nossa condição de metrópole que uma capital acaba por ser e que se agudizaram depois de 1974. O “problema” Algarve, Madeira, Alentejo ou FCP não existe em Lisboa, só existe porque nos fazem tropeçar nele construindo o alçapão à nossa frente. Bastaria que me enganasse agora no “m” e escrevesse Metrópole, a palavra deixasse de ter o seu principal significado e passasse a ter a do tempo do “botas” e estaria o caldo entornado.

É verdade que as coisas já não estavam bem políticamente com tanto ataque desconchavado e despropositado, sempre heroicamente suportados no continente, apenas com o único intuito de manter no fio da navalha o nível de qualquer negociação de verbas. Mas começo também agora a sentir de outros sectores a intolerância de demasiado prurido no ar que legitíma o discurso alarve e gafanhoteiro que temos ouvido. Estarão todas estas décadas da específica democracia madeirense a conseguir objectivos não confessados? Conseguirão os madeirenses guindar a heróis insulares figuras como um Alberto João e um Jaime Ramos? Seria uma pena. Por duas boas razões: uma, pela infelicidade óbvia que seria ter figuras daquelas a iniciar uma galeria de retratos oficiais e outra pela injustiça que estariam a cometer com o Povo Português que não teria culpa de nada.

Ainda a propósito, recomendo a leitura no Público deste Sábado de mais uma especificidade daquela democracia. Mas foi tudo jogo limpo!

4 comentários:

VFS disse...

Graza, quem utiliza, hoje, o vocábulo "metrópole" não o faz com candura. Pelo menos não é a candura quem sustentava essa palavra, quando escrita por Eduardo Prado Coleho, no Público do dia 14 de Novembro. (http://estrangeiros.blogspot.com/2006/11/madeira-e-metrpole-por-eduardo-prado.html)Cito:

"Ainda por cima, além de imaginar complots por dá cá aquela palha, e de exibir uma linguagem extremamente grosseira, julga que na metrópole alguém o toma a sério."

A intenção de EPC é clara. E não aleguem que a palavra já existia antes do salazarismo, porque a "solução final" de Hitler também. Todavia, penso que não há quem se atreva a invocar a necessidade de uma "solução final". Imagine-se Rui Rio e a questão dos arrumadores de carros. Se o autarca advogasse a "solução final" o que lhe sucederia? As palavras têm uma história, e as pessoas argutas sabem quando devem utilizá-las, ou omiti-las. EPC soube, mas queria uma reacção para amarfanhar o outro com o peso da sua sapiência. Comigo, enganar-se-ia, porque detectei o embuste a tempo.
Quanto ao resto, e como sabe, estamos de acordo. Mas este povo é lasso, e acaba por ter o que merece.

Graza disse...

O meu comentário alonga-se e tem mais forma de post e assim vai, um pouco mais acima, não sendo uma resposta concreta é mais um ponto de vista.
Mas o que não posso deixar-lhe passar aqui é a de: “Mas este povo é lasso, e acaba por ter o que merece.” Mas, um povo nunca merece títere nenhum. Uns porque não têm culpa nenhuma e os seus atrasos correspondem a erros de polticas de orientação muitas vezes bastante antigas que provocaram verdadeiros abismos em matérias de evolução cultural comparada e outros não merecem porque também são conhecidos os fenómenos de histeria colectiva que tão depressa os fazem ulular em qualquer Chão ou Terreiro como os põem em massa na rua num 1º de Maio libertário. Ficam no entanto dúvidas para os povos que têm tendência para a reincidência. Esses dão-me sempre que pensar.

VFS disse...

O povo é titere nas mãos do Jardim, e não o contrário. O povo a que me refiro - e sabemos de que parcelas falamos - tem culpa pela decrepitude cultural. E os povos também têm culpas no curso da história. Por isso, a perpetuação de Jardim no poder é, também, uma consequência de uma passividade acéfala.
Acerca da culpabilidade dos povos, nunca a História ilibará o povo alemão, por ter apadrinhado a ascensão de Hitler ao Reichtag.

Graza disse...

Como já o disse, a utilização muito peculiar de alguns vocábulos na construção da sua escrita acabam por lhe dar um valor acrescido e uma força bem marcada.
Isto também faz com que alguns termos reapareçam depois - brincando com as palavras – na comunicação consigo. Foi o caso da utilização de “títeres”. Na verdade tem razão, o povo da Madeira é uma marioneta naquelas mãos, mas naquela frase eu estava a considerar o Povo com letra grande, o povo generoso que acredita e está sempre pronto a recomeçar com a mesma humildade. O “títere” ali, era para mim, representado por aqueles que costumo ver gesticular, na televisão, sem som, e que adquirem então a sua imagem real: verdadeiros bonecos prontos a cair se lhes cortarem os fios que os sustentam. Servi-me daquele sinónimo para inverter as suas condições, porque o povo já eu estava a guindar a outro estatuto.
Quanto ao povo alemão, acertou, era exactamente nele que pensava, e penso, sempre que reflicto sobre isto. Mas se não deveremos ( ? ) amnistiar comportamentos colectivos que comprovadamente reflectem o mau carácter ( ? ) dos seus actores, noutros, não tenho dúvidas que as lacunas circunstanciais são produto de orientações erradas e sempre mal tomadas em seu nome. Mas a mudança urge e falta paciência e foi por isso que Jorge de Sena foi tão cáustico com este país.
http://users.isr.ist.utl.pt/~cfb/VdS/v041.txt