17 junho 2007

APL. Privados do Tejo




Para manterem a sua importância as cidades têm que vencer barreiras que não existiam quando a sua localização as tornou estratégicas. Ao longo do tempo modificam-se algumas condições, natural ou artificialmente, que lhes fazem perder o valor que as levou à prosperidade. É exemplo desta modificação natural a cidade de Santarém e a perda da navegabilidadade do rio, tão usada por várias civilizações. Mas também nos tempos modernos se têm criado obstáculos à evolução da forma como tinham sido criadas. E é exemplo desta modificação artificial a cidade de Lisboa e a ocupação da sua zona oriental pelo desenvolvimento industrial e a respectiva necessidade de transportes ferroviários que levou à criação da linha férrea de Sta. Apolónia a Vila Franca. Se juntarmos depois o aparecimento da linha do Cais do Sodré a Cascais, verificamos que foi criado pelas duas linhas um arco de estrangulamento à plena fruição das suas margens que levou quase ao abandono da sua zona ribeirinha.

Resta agora uma zona compreendida entre Sta. Apolónia e o Cais do Sodré, como a única livre de linha férrea e portanto a única disponivel para uma utilização mais dinâmica da zona do rio. Ou melhor, restava, porque é exactamente para aqui que se pretende transferir o cais dos grandes cruzeiros que inclui o levantamento de uma barreira de construções de apoio ao novo porto que envolve o condicionamento quase total daquela zona.

Lisboa continua navegável e não deixou de ter amarração, basta subir ou descer para se encontrar zona do rio já interdita pela linha e aí refazer o porto. Mas nós somos assim, permanentemente embevecidos pela cultura do pato bravo: quanto mais raro mais valioso, melhor para construir e cimentar. Ninguém nos perguntou se queriamos definitivamente aquela zona transfornada num espécie de condomínio fechado. O processo já está em andamento e parece que ninguém deu por isso, mas também é verdade que poucos dos que souberam, reagiram e são sempre os mesmos a fazê-lo:

“De Miguel Sousa Tavares, no Expresso:
Pois então, lá vamos outra vez. A distinta Administração do Porto de Lisboa (APL) está lançada em mais uma tentativa de nos roubar parte do Tejo. Agora é o projecto do novo terminal de passageiros de paquetes em Santa Apolónia. Um muro de construções de oito metros de altura por seiscentos de comprido (!), que inclui centros comerciais e hotel. Também na zona do Cais do Sodré está a nascer, a uma velocidade incrível, uma construção maciça, em cima do rio, e que vai quase até ao Terreiro do Paço, eliminando uma zona de jardim, de passeio e de vista. Suponho que seja também obra do porto de Lisboa, uma vez que nenhuma placa no local indica do que se trata e eu já sei que, à beira-rio, do Parque das Nações a Algés, mandam esses senhores e ninguém tem mão neles.
Este porto de Lisboa é verdadeiramente um «case study» de pirataria impune. Têm ao seu dispor a melhor de todas as zonas da cidade de Lisboa: 13 quilómetros de frente de rio — um luxo em qualquer cidade do mundo. São terrenos do domínio público marítimo, isto é, terrenos públicos,” ...

Leia o resto aqui no Instante Fatal.

1 comentário:

Unknown disse...

É de facto lamentável a forma ignomiosa como em Portugal a ideia de desenvolvimento acaba quase sempre por significar lucro fácil para alguns e uma alienação completa de património de elevado valor histórico e cultural.

E é assim que assassinamos todo o nosso potencial turístico (já para não falar na perda de qualidade de vida!). Isto num país cujo governo sonha com uma OTA que apresenta como justificação (entre outras!) estudos que revelam números astronómicos de turistas a afluir ao nosso país.

Ora, qual é o interesse em visitar "mamarrachos" de betão?!